Vicente Jorge é paulista, nascido em Penápolis, vive em uma chácara, em Jaguariúna, interior de São Paulo, que gosta de chamar de refúgio, e é expert em vinhos. Aos 55 anos, é marido, pai, avô, adora cachorros! E, coleciona meias e vinhos: é aqui que tudo muda e a biografia deixa de ser a “de um sujeito padrão” e o torna uma figura interessante e que exerce uma rara profissão: caçador de vinhos!
Sim, ele viaja o mundo procurando, provando e analisando rótulos, de novidades e apostas aos clássicos. Não, não se trata de mais uma ‘profissão ou profissional’ da moda, que aparece de uma hora para outra, especialmente nas redes sociais.
São 30 anos de carreira no mundo do vinho exercendo esse ofício. Tanto é que não consegue precisar, milimetricamente, tudo o que já viveu (e bebeu!), mas alguns números impressionam: já visitou cerca de 1.200 vinícolas em mais de 30 países. Não consegue dizer quantos vinhos já provou na vida, mas consegue dar dados mais precisos do que degustou na última década: 2.300 rótulos diferentes, por ano.
Carreira do expert em vinhos
No currículo, ele que é publicitário por formação, guarda prêmios e condecorações como Comendador da “Commanderie du Bontemps” Bordeaux, Prud’homme de Saint Emilion, Hospitalier de Pomerol, Cavaleiro dos vinhos do Porto, Confrade de honra de Ribeira del Duero, Chevaliers du Taste Vin – Bourgogne, entre outros.
Percurso que, em nenhum momento, o jovem de 17 anos que estava morando em Manhattan, nos Estados Unidos, e precisava de “uns bicos” para sobreviver. Virou motorista, transformou-se em Sebastian Alex e passou a comandar uma limousine que atendia figurões – entre eles, um milionário do ramo imobiliário de Nova York, que virou seu patrão. “Nas horas vagas, organizava a adega de mais de 1.500 garrafas do meu chefe. Ali, a minha curiosidade pelos rótulos começou, grande parte era Bordeaux e Bourgogne”, conta ele. “Após os jantares, eu provava tudo e comecei a entender as diferenças de estilo e passei a comprar livros, já que naquela época não existia internet para pesquisar. Volto para o Brasil já atraído pelo mundo dos vinhos, comecei a fazer todos os cursos existentes, estudar e praticar”.
Não demorou muito e foi trabalhar na Interfood, importadora em que trabalhou por 11 anos, uma de suas funções era de circular pelos quatro cantos do globo ajudando a abastecer o portfólio da empresa. Ali, já começou a entender que não basta conhecer a bebida em si, sua produção e nuances no paladar, mas saber como funciona o mercado, entender de economia e de assuntos globais, já que o sucesso de uma negociação, muitas vezes está no relacionamento, o que significa não só longas reuniões, mas também cafés, almoços, jantares…
Em 2012, recebeu o desafio de mudar de emprego, para ajudar a criar um clube de vinhos por assinatura: a missão seria semelhante à anterior, caçar bons vinhos e descobrir novos produtores – um dos cases de sucesso foi ter participado da equipe responsável por trazer o sucesso monstruoso da Toro Loco para o Brasil. E junto com Manu, fiel parceiro nas caças de vinhos, ajudamos a cria o estilo do restante da linha Toro loco, Cava, Brancos e Roses e especiais, já que só havia um vinho, o tinto. Vale destacar que quando assumiu o cargo, a empresa estava começando e com cerca de 10 mil assinantes; oito anos depois, o montante mudou para 250 mil nomes e a marca consagrou-se como “o maior clube de vinhos do planeta”. Desafio cumprido, Vicente resolveu seguir novos voos – hoje ele está na TodoVino; e projetos pessoais como o Enclos du Wine Hunter.
Quais são os passos para se tornar um expert em vinhos?
Um caçador de vinhos deve, no mínimo, entender de todas as esferas que envolvem a bebida e o mercado e não só da produção. Deve saber da importância do relacionamento e cultivar ‘fontes’, pesquisar muito, saber das tendências. E, estar atualizado não só com o mundo dos vinhos em si, mas entender do que acontece com a política e de assuntos ligados ao panorama global do planeta e, claro, do país que está visitando, já que uma negociação sempre vai acabar numa mesa onde se fala de tudo! Ser um excelente sommelier e não saber se relacionar, negociar, não significa ser um ‘caçador de vinhos’. Se tem uma palavra que define esse ofício, essa palavra é relacionamento!
E, qual é o ‘lado B’, da vida de um caçador de vinhos?
“Quando você fala que “ganha para viajar o mundo, conhecer lugares incríveis, restaurantes maravilhosos e ainda beber uma infinidade de vinhos”, todos acham que é só glamour”, diz ele.
“Mas, como toda profissão, existem perrengues: ficar três dias no verão da Puglia com sua mala extraviada em Roma – isso é comum, mas não é agradável. Certa vez, um voo atrasou mais de oito horas e me fez dormir no próprio saguão do aeroporto, em Miami, o que me fez perder a conexão de Johannesburgo para Cape Town, devido à falta de estrutura, já que a etapa da imigração levou cerca de 4 horas! Tem também aquelas clássicas histórias de provar pratos que o anfitrião é famoso: um produtor de vinhos já preparou para nós, um canguru ao molho de Shiraz, que era um horror!” afirma com convicção.
Tudo harmoniza, ou quase tudo, mas existem bebidas que combinam além da harmonização. Como, por exemplo, o acarajé é fantástico com Champagne, agora é o momento certo?! Existem pessoas que pedem para tirar o coentro da moqueca para não conflitar com o vinho!
Acredita que democratizar é não superfaturar, é selecionar e indicar coisas boas para cada tipo de bolso e não tentar “enfiar” vinho em todos os momentos de consumo. Cansou de ver sugestões de harmonização de vinho e feijoada e, na hora H, o que vale é a caipirinha, cerveja ou coca zero!
Quais são as preferidas do expert em vinhos?
Várias! Mas, Mosel, na Alemanha; Durbanville Hills, na África do Sul; e Saint-Emilion, na França; acho as fotos mais bacanas. Porque?
Meia Mosel
Umas das fotos mais bonitas que fiz! Atravessamos o rio, pois queria de fundo a casa do produtor. Rodamos um tempão para achar um lugar livre, já que a margem é rodeada de casas e quando conseguimos o lugar perfeito, choveu – e, detalhe, estava uns 4 graus negativos. Mas, não dava pra desistir e assim que a chuva deu uma amenizada, não tinha outra alternativa: sentar na beira do rio todo encharcado! A foto ficou linda, mas depois fui congelado até Frankfurt.
Meia Toscana
Essa história poderia não ser verdade se não fosse à Toscana! Saímos de uma degustação onde o lugar não tinha um visual legal e fomos buscando uma paisagem típica para esse registro. Antes de chegar à Siena, perto de Castellina, achamos a paisagem perfeita! Foto feita, ouvi um barulho estranho nos arbustos que estávamos e não deu outra: uma família de porco selvagem com filhotes começou a grunhir e a mãe disparou em nossa direção com uns dentes enormes! Não deu tempo nem de calçar as botas, sorte que estávamos perto do carro!
Meia Douro
Essa talvez seja a que mais deu trabalho! Não pela paisagem, pois a região é incrível e estávamos em uma vinícola espetacular no Douro Superior. Pois bem: o lugar era alto, a paisagem perfeita, foto tirada… E, a bota despenca uns 50 metros lá pra baixo! E, eu fiquei uma hora me engalfinhando na vegetação para pegar e mais uma hora para conseguir subir! Detalhe: só de meias, né, e nessa viagem só tinha levado esse par de calçados.
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